sábado, 29 de janeiro de 2011

NEUROÉTICA

Uma das áreas de estudo e pesquisa que tem me fascinado muito é a neuroética. Ela é um novo campo de pesquisa que trata de questões comuns à neurociência, filosofia e ética. Inclui o estudo das implicações das novas descobertas sobre o funcionamento do cérebro humano e a possibilidade de existirem bases neurais determinantes do comportamento ético. O debate acerca das relações entre neurociências e o campo da ética vem se expandindo rapidamente com o progresso dos conhecimentos empíricos sobre o funcionamento cerebral e com a acelerada inovação no campo das neurotecnologias. As descobertas científicas das neurociências apresentam possibilidades para novos diagnósticos e tratamentos, e consequentemente, dão uma contribuição para uma compreensão mais ampla da natureza humana. Um exemplo disso são novas técnicas como ressonância magnética (fMRI) e tomografia por emissão de prótons (PET).

Na filosofia, o impacto principal da neurociência se reflete principalmente na ética em questões como livre-arbítrio, responsabilidade e culpabilidade pelas ações individuais, emoção, razão etc. Esse novo campo de discussão da ética é inerente ao séc. XXI e tem como terminologia inicial o nome de NEUROÉTICA. (definida em 2002 por Adina Roskies)

O campo de abordagem da neuroética se dá em duas perspectivas distintas: neurociência da ética, que faz uma investigação acerca das bases neurobiológicas da conduta moral e ética das neurociências, cujo foco é a discussão sobre os desafios e problemas éticos surgidos com a ampliação de nossa capacidade de intervir decisivamente sobre o cérebro, a experiência subjetiva e a vida social a partir das descobertas teóricas e das invenções técnicas das neurociências. O objeto da neurociência da ética é analisar as influências que as pesquisas em neurociências, principalmente as do início do terceiro milênio, terão no enfrentamento de questões ético-filosóficas do século XXI.

Algumas questões pertinentes a neurociência da ética: como continuaremos a desenvolver as idéias sobre lívre-arbrítrio e responsabilidade, sabendo que muito do que se descobre a partir das pesquisas em neurociências sobre o funcionamento do cérebro e suas sinapses apontam para a idéia de que o homem age de forma causal? Realmente podemos esperar que o homem aja sempre de forma mais racional que emocional, reforçando um tipo de dualismo cartesiano nas questões filosóficas sobre mente e cérebro? Será possível dissecar o funcionamento do cérebro a ponto de se achar a formação do pensamento?

Alguns teóricos contemporâneos apresentam um esforço na direção de diminuir essa divisão entre juízos morais e aspectos biológicos, como por exemplo Joshua Greene, com a hipótese de existência de bases neurais dos conflitos cognitivos e o controle e origem dos julgamentos morais. Também Adina Roskies, que estabelece os elementos conceituais para a discussão de uma neuroética. Na ética de Peter Singer, a proposta vai além dos limites da espécie humana e apresenta um questionamento da superioridade da espécie humana (especimo), com importantes estudos dos comportamentos de escolha e preferências em outras espécies.

Para o neurocientista e filósofo Antonio Damásio todas as características da humanidade resultam de uma evolução biológica e adaptativa e que a consciência humana é resultado dessas vantagens evolutivas. Os valores éticos podem ser entendidos como estratégias de sobrevivência da espécie apoiadas nos sistemas neurais que executam as condutas instintivas. Essa afirmação é feita em seu livro O Erro de Descartes e tem como pano de fundo um novo contexto e, ou, novo campo de discussão e conhecimento que leva em si a necessidade de interdisciplinariedade entre neurociências, psicologia e filosofia, mais especificamente a ética e a origem dos juízos morais. Damásio inicia seu livro descrevendo casos em que danos físicos e localizados no cérebro, causados por acidentes ou até mesmo por intervenções cirúrgicas, determinaram alterações de comportamento e da personalidade dos pacientes. A partir do relato de casos concretos algumas certezas no campo da ética se tornam discutíveis. O caso apresentado com mais detalhes é o de Phineas Gage, trabalhador da construção civil que tem o cérebro perfurado em um acidente de trabalho em 1848. Ele se recupera completamente, mas sua personalidade e suas atitudes sociais sofrem mudanças. Em um tópico do último capítulo, o autor esclarece o título de sua obra e diz que é uma crítica ao Dualismo Cartesiano, que tanto influenciou e influencia até hoje as ciências e as humanidades no mundo ocidental.

Uma conseqüência desse dualismo na ética é, segundo Damásio, a sugestão de que o raciocínio, o juízo moral e o sofrimento causado por uma dor física ou agitação emocional poderiam existir independentemente do corpo. As descoberta da neurociência questionam essa afirmação. O erro de Descartes seria especificamente fazer uma separação das operações mais refinadas da mente e a estrutura e funcionamento do organismo biológico, porque, na opinião de Damásio a mente humana reage com base em percepções internas e externas, e a consciência é o resultado.

Damásio defende a existência de uma natureza física da consciência e pretende demonstrar como a consciência é construída no cérebro humano. Essa via de naturalização da consciência apresenta-se hoje como uma estratégia para o aprimoramento da compreensão científica e filosófica acerca dos fenômenos mentais. Este é o campo da neuroética.

Prof. Ives Alejandro
embuscadamente.blogspot.com

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