
Hoje em dia, muitas pessoas falam em iniciação. Todos querem ser
iniciados. Mas entendem por iniciação uma alô-iniciação, uma iniciação por outra
pessoa, por um mestre, um guru. Esta alô-iniciação é uma utopia, uma ilusão, uma
fraude espiritual.
Só existe
auto-iniciação. O homem só pode ser iniciado por si
mesmo.
O
que o mestre, o guru, pode fazer é mostrar o caminho por onde alguém se pode
auto-iniciar; pode colocar setas ao longo do caminho setas ao longo da
encruzilhada, setas que indiquem a direção certa que o discípulo deve seguir
para chegar ao conhecimento da verdade sobre Si mesmo. Isto pode e deve o mestre fazer -
suposto que ele mesmo seja um
auto-iniciado.
Jesus, o maior dos Mestres que a
humanidade ocidental conhece, ao menos aqui, durante três anos consecutivos,
mostrou a seus discípulos o caminho da iniciação, o que ele chama o "Reino dos
Céus", mas não iniciou nenhum dos seus discípulos. Eles mesmos
se auto-iniciaram na gloriosa manhã do domingo de Pentecostes, às 9 horas da
manhã - como diz Lucas nos Atos dos Apóstolos. Mas esta grandiosa auto-iniciação
aconteceu só depois de 9 dias de profundo silêncio e meditação; 120 pessoas se auto-iniciaram, sem
nenhum mestre externo só dirigidas pelo mestre interno de cada um, pela
consciência de seu próprio EU divino, da sua alma do seu Cristo Interno. E esta
auto-iniciação do primeiro Pentecostes, em Jerusalém, pode e deve ser realizada
por toda pessoa.
Mas acima de tudo, o
que quer dizer Iniciação?
Iniciação é o início na experiência da verdade sobre si mesmo. O
homem profano vive na ilusão sobre si mesmo. Não sabe o que ele é realmente. O
homem profano se identifica com o seu corpo, com a sua mente com as suas
emoções. E nesta Ilusão vive o homem profano a vida inteira, 30, 50, 80 anos.
Não se iniciou na verdade sobre si mesmo, não possui autoconhecimento, e por
isso não pode entrar na auto- realização. O que deve um homem profano fazer para
se auto-iniciar? Para sair do mundo da ilusão sobre SI mesmo e entrar no mundo
da verdade? Deve fazer o que fez o primeiro grupo de auto-iniciados, no ano 33,
em Jerusalém, isto é, deve aprender a meditar, ou cosmo-meditar.
O
iniciado dá tudo e não espera nada do mundo.
Ele já
encerrou as contas com o mundo.
Pode
dar tudo sem perder nada.
O auto-iniciado é um místico não um místico de
isolamento solitário, mas um místico dinâmico e solidário, que vive no meio do
mundo sem ser do mundo.
Onde há plenitude, aí há um transbordamento. O
homem plenificado pelo autoconhecimento e pela auto-realização transborda a sua
plenitude, consciente ou inconscientemente, saiba ou não saiba, queira ou não
queira.
Esta
lei cósmica funciona infalivelmente. Ele faz
o bem pelo fato de ser bom,
de viver em harmonia com a alma do Universo. Por isto, para fazer bem aos outros
e à humanidade, não é necessário nem é suficiente fazer muitas coisas, mas é
necessário e suficiente ser bom, ser realizado e plenificado do seu EU
central, conscientizar e vivenciar de acordo com o seu EU central, com o seu
Cristo Interno. A plenitude da consciência mística da paternidade única de Deus
transborda irresistivelmente na vivência ética da fraternidade universal dos
homens.
Para ter laranjas - laranjas verdadeiras - não é necessário
fabricá-las. É necessário e suficiente ter uma laranjeira real e mantê-la forte
e vigorosa. Nem é necessário ensinar a laranjeira como fazer laranjas, ela mesma
sabe, com infalível certeza, como fazer flores e frutos. Assim, toda a
preocupação de querer fazer bem aos outros sem ser bom é uma ilusão tão funesta
como o esforço de querer fabricar uma laranja verdadeira sem ter uma laranjeira.
Mais importante que todo o fazer é o
ser. Onde não há plenitude interna não pode haver
transbordamento externo.
Para fazer o bem aos outros deve o homem
ser realmente bom em si mesmo. Que quer dizer ser bom? Ser bom não é ser
bonachão, nem bonzinho, nem bombonzinho. Para ser realmente bom deve o homem
estar em perfeita harmonia com as leis eternas da verdade, da justiça, da
honestidade, do amor, da fraternidade, e viver de acordo com esta sua
consciência. Todo o fazer bem sem ser bom é ilusório, assim como qualquer
transbordamento é impossível sem haver plenitude. O nosso fazer bem vale tanto
quanto nosso ser bom. O ser bom é autoconhecimento e
auto-realização.
Somente o conhecimento da verdade sobre si mesmo é
libertador; toda e qualquer ilusão sobre si mesmo é escravizante.
Os mais
ruidosos sucessos sem a realização interna são deslumbrantes vacuidades; são
como bolhas de sabão - belas por fora, mas cheias de vacuidade por dentro. 1% de
ser bom realiza mais do que 100% de fazer bem. Auto-iniciação é essencialmente uma
questão de ser e não de fazer. Esta plenitude do ser não se
realiza pela simples solidão, mas pelo revezamento de introversão e extroversão.
O homem deve, periodicamente, fazer o seu ingresso dentro de si mesmo, na
solidão da meditação e depois fazer o regresso para o mundo externo, a fim de
testar a força e autenticidade do seu ingresso.
Todo auto-iniciado consiste nesse
ingredir e nesse regredir, nessa implosão mística e nessa explosão
ética.
Os discípulos de Jesus fizeram três anos de aprendizado e nove
dias de meditação, depois se auto-iniciaram. Descobriram a verdade
libertadora sobre si mesmos. A verdade que os libertou da velha ilusão de se
identificarem com o seu corpo, com a sua mente, com as suas emoções, saíram das
trevas da ilusão escravizante, e ingressaram na luz da verdade
libertadora:
“Eu
sou espírito, eu sou alma, eu e o Pai somos um, o Pai está em mim e eu estou no
Pai... o Reino dos Céus está dentro de mim."
(é a afirmação da UNIDADE de toda a VIDA)
E quem descobre a verdade sobre si
mesmo, liberta-se de todas as inverdades e ilusões. Liberta-se do egoísmo, da
ganância, da luxúria, da vontade de explorar, de defraudar os outros. Liberta-se
de toda injustiça, de toda desonestidade, de todos os ódios e malevolências - de
todo o mundo caótico do velho ego. O iniciado morre para o seu ego ilusório e
nasce para o seu EU verdadeiro. O iniciado dá o início, o primeiro passo, para
dentro do "Reino dos Céus". Começa a vida eterna em plena vida terrestre. Não
espera um céu para depois da morte, vive no céu da verdade, aqui e agora - e
para sempre. Isto é auto-iniciação. Isto é autoconhecimento. Isto é
auto-realização.
Humberto Rohden - Livro Profanos e Iniciados