segunda-feira, 11 de julho de 2016

EVOLUÇÃO DA CRIANÇA SEGUNDO ANTROPOSOFIA

A criança, meio inconsciente e sonhadora, está entregue às influências do ambiente. Tudo a permeia. O ideal seria deixar a criança pequena entregue à sua fantasia, num mundo harmonioso, sem distúrbios. Durante os primeiros três anos a criança aprende mais do que em qualquer outra época da vida: o andar ereto, o falar e o pensar são três vitórias básicas sobre o animal. Com elas, a criança torna-se homem. Durante essas três conquistas, e durante todo o resto da evolução, pais ou outros adultos devem sempre estar presentes para dar uma mão, tão firme quanto carinhosa. De dentro para fora, deverá desabrochar uma vida anímica baseada principalmente no corpo, na vida orgânica e seus ritmos.  A disciplina e a regularidade são base para toda a sua vida futura e constituem uma poderosa ajuda para o fortalecimento de sua confiança e o desenvolvimento de uma criança segura de si.

Em fins do século passado o grande biólogo Ernst Haeckel formulou sua genial lei bio-genética fundamental: “Em sua evolução embrionária, todo animal percorre, sucessivamente, estados correspondentes aos graus de evolução que os animais inferiores percorreram, na história das espécies, até chegarem a ele”. Essa lei pode ser aplicada, de certa maneira, à evolução da criança: ela também repete, de maneira concentrada, as várias fases da evolução anímico-espiritual do gênero humano.
Antes de examinar as etapas da evolução da criança, lembremo-nos de alguns fatos importantes:
A personalidade não nasce com o nascimento! O eu de um recém-nascido é tão velho como o de qualquer outra pessoa. Na presente encarnação, porém, ele ainda não permeou os diversos envoltórios terrenos.
No decorrer da vida, o eu procura realizar-se, a si e ao seu carma. Pais e educadores devem ajudá-lo nessa tarefa.
Daí a grande responsabilidade de quem lida com crianças. Não se pode criar uma personalidade, um eu! Mas pode-se favorecer ou dificultar o seu desabrochar correto.
Muito do que é aprendido na vida infantil, e esquecido depois, reaparece mais tarde, sob forma de faculdades adquiridas. A lei da metamorfose domina a evolução da criança.
Rudolf Steiner ensina que a vida humana é caracterizada por ciclos de 7 anos, marcados pela predominância de determinada configuração anímico espiritual.
Sem investigar o porquê desses ciclos, estudaremos rapidamente os três primeiros.
Ao nascer, o corpo físico está “acabado”. Existem e funcionam todos os órgãos (menos os da reprodução). Mas o corpo etérico ainda está, durante os primeiros sete anos, intimamente ligado ao corpo físico, ao qual consolida, estrutura e dota de funcionamento certo: a criança se fixa pouco a pouco na alimentação dos adultos, ergue-se, aprende a mover-se no espaço, aprende a falar; finalmente, o aparecimento da segunda dentição marca a época em que essa tarefa plasmadora do corpo etérico chega a um certo fim, libertando-o em parte para outras funções. Poderíamos, pois, dizer que o nascimento de um corpo etérico autônomo apenas ocorre aproximadamente aos 7 anos, na idade em que a criança está pronta para entrar na escola.
Quem conhece a existência de um corpo etérico, e mais ainda, quem admite o seu intenso desenvolvimento durante os primeiros 7 anos de vida, (o corpo físico foi construído durante os 9 meses de gravidez) não estranha que esse corpo precise de “alimentação” adequada. Em outras palavras: para se desenvolver harmoniosamente, o corpo etérico deve receber certos impulsos; em caso de falta destes, ou quando são prejudiciais, o corpo etérico não desenvolve harmoniosamente suas forças e funções.
Quais são esses alimentos úteis?
Em primeiro lugar, tudo o que constitui um ritmo. A regularidade da vida cotidiana (horas certas para se levantar, comer, deitar-se) e a repetição de certos atos (passeios, oração para agradecer o alimento que recebe, ouvir sempre uma história antes de dormir) constituem uma poderosa ajuda para o fortalecimento do corpo etérico, dando à criança uma confiante segurança.
Depois, a criança deve ter a possibilidade de dar vazão à sua fantasia criadora. De dentro para fora, deverá desabrochar uma vida anímica baseada principalmente no corpo, na vida orgânica e seus ritmos. Contos de fadas devem animar a imaginação; brinquedos simples devem deixar lugar à fantasia. Nada de trens elétricos, de brinquedos mecânicos, de bonecas de matéria plástica, caricaturas horríveis de seres humanos. Todos esses brinquedos matam a imaginação da criança e desfiguram seus instintos plasmadores e sadios. Nada também de formas geométricas, de jogos de matéria plástica que deturpam o sentido táctil da criança. Materiais naturais, pedaços de madeira, trapos, pedras, conchas, plantas, areia, lápis de cera, eis os companheiros ideais, com os quais a criança pequena, cheia de imaginação, constrói o “seu” mundo.
Nessa idade, mais do que em qualquer outra, a criança, meio inconsciente e sonhadora, está entregue às influências do ambiente. Tudo a permeia. Como o seu organismo tão delicado sofre com discussões em voz alta entre seus pais, com o ruído do rádio, com as irradiações da TV, com o barulho e o nervosismo da nossa vida citadina, e com as mudanças bruscas de ambiente!
O ideal seria deixar a criança pequena entregue à sua fantasia, num mundo harmonioso, sem distúrbios. Nessa idade a criança não é acessível a conceitos de moral e a regras abstratas de comportamento. Ela vive imitando o seu ambiente, em geral de maneira inconsciente. Muitas vezes, a semelhança de uma criança com seus pais ou avós não é congênita, mas adquirida pela imitarão de gestos e expressões. O exemplo dos pais e irmãos educa, e não os gritos e preceitos lógicos.
Durante os primeiros três anos a criança aprende mais do que em qualquer outra época da vida: o andar ereto, o falar e o pensar são três vitórias básicas sobre o animal. Com elas, a criança torna-se homem. Durante essas três conquistas, e durante todo o resto da evolução, pais ou outros adultos devem sempre estar presentes para dar uma mão, tão firme quanto carinhosa. A pequena criança deve ser guiada! Nada mais errado do que deixá-la sempre “livre”. A disciplina e a regularidade são alimentos da sua organização etérica, base de toda a sua vida futura.
Se as crianças já aparentam, muitas vezes, um caráter bem pronunciado, elas não possuem ainda, salvo erros da educação, manifestações tipicamente intelectuais e conscientes. A criança pequena naturalmente possui um eu, mas ainda sem autoconsciência. Ela vive entregue ao mundo exterior que a permeia. Até a idade de três anos, ela nem emprega as palavras “eu” ou “você”: chama a si própria pelo seu nome (“Maria quer comer”), e somente a partir dessa idade nascem os primeiros vestígios da memória permanente: o adulto, em geral, não tem reminiscências de fatos anteriores à idade de três anos.
Qualquer despertar artificial e prematuro das faculdades sentimentais e mentais prejudica a evolução harmoniosa da criança. Ela chegará sozinha ao grau de desenvolvimento que constitui o fim desse primeiro período de 7 anos e que se manifesta por vários sinais: ela se alonga, seus dentes definitivos aparecem, ela muda de aspecto e tudo indica que está, com o segundo período de 7 anos, ingressando na maturidade escolar.
O segundo período, que se estende dos sete aos catorze anos, é caracterizado pelo desenvolvimento intensivo do corpo astral, que passa a ser o elemento predominante, até o seu turbulento “nascimento” definitivo, no momento do reboliço da puberdade. A astralidade toma, então, posse do corpo físico.
Durante essa fase – que corresponde à idade escolar – é principalmente o corpo astral que deve ser “alimentado” de maneira sadia, como o corpo etérico o foi durante a época anterior. Os sentimentos se formam e precisam de impulsos apropriados. Os sentidos, de simples órgãos sensitivos, passam a ser “antenas” de uma alma: a criança começa a adorar música, pintura; ela compartilha dos sofrimentos e das virtudes dos heróis das suas leituras; em uma palavra, a alma e a vida anímica passam ao primeiro plano.
Nessa idade a criança desenvolve seus dons artísticos. Ao mesmo tempo, o corpo etérico, liberto das suas tarefas do primeiro setênio, torna-se instrumento poderoso do pensar e da memória. Ainda seria prematuro qualquer intelectualismo (que pressupõe o poder de abstração do eu), mas acoplado à vida sentimental, o pensamento se torna capaz de grandes esforços deverá ser desenvolvido na escola de maneira adequada.
Entre os “alimentos” do corpo astral figuram ideais, exemplos de figuras com sentimentos nobres e empolgantes. Os grandes heróis dos mitos e da história fecundam a imaginação e o idealismo, as vivências artísticas elevam a alma e o corpo inteiro, com a sua intensa reserva de forças, quer ser o instrumento de impulsos volitivos (esporte), estéticos (dança, mímica), etc. A imaginação e a fantasia sentimental se projetam para fora, e nunca, mais tarde de, as crianças saberão interpretar com tanto fervor, em peças teatrais ou pequenas encenações de vivências próprias.
Os perigos, nessa idade, são múltiplos, mas o maior é a fixação do idealismo e da fantasia em figuras de valor duvidoso. Daí o efeito nefasto das estórias em quadrinhos, da idolatria de bandidos. Horrível também é a influência dos meios modernos de divulgação, com seu baixíssimo nível moral, intelectual e artístico: TV, rádio, revistas, etc. Os crimes que se cometem contra a criança nessa idade têm efeitos incalculáveis e definitivos.
Nessa idade, dos 7 aos 14 anos, a personalidade já se afirma mais. Não se limitando a imitar, a deixar-se permear, a criança quer agora idealizar, respeitar, venerar. A autoridade baseada no afeto, no amor, é a melhor relação pedagógica nessa idade, e o professor deve respeitar o eu dos seus alunos, que se vai afirmando cada vez mais, e ao mesmo tempo procurar corresponder ao seu idealismo ainda meio inconsciente.
No terceiro período, dos 14 aos 21 anos, a parte que se desenvolve é o eu. Tendo alcançado sua plena maturidade, o indivíduo é considerado civil e penalmente responsável; passa a ser um membro aprovado da coletividade.
Com a evolução do eu, nasce a consciência da própria personalidade e, com ela, um sentimento de alienação e de separação dos outros. O indivíduo começa a ter uma vida íntima própria. O adolescente faz poesias, a mocinha escreve um diário íntimo. Depois da crise da puberdade, a vida sentimental, salvo influências negativas de fora, se sublima. O jovem começa a “amar”. Ao mesmo tempo, seu idealismo se dirige para objetos mais elevados, mais abstratos: discussões filosóficas e metafísicas, ideais políticos e sociais, enchem-Ihe o espírito.
Nessa altura suas faculdades mentais estão plenamente desenvolvidas.
Sem perigo de prejuízos, o pedagogo pode e até deve recorrer ao poder de abstração do seu aluno. Do mundo da alma, o jovem passa ao mundo do espírito. Dúvidas e problemas religiosos o atormentam; ele começa a criticar tudo. Uma educação bem dirigida não impedirá esse desejo de criticar, mas procurará evitar o cinismo e a negatividade, dando ênfase à necessidade de sempre respeitar o outro, de nunca esquecer a própria responsabilidade moral e social.
O término dos estudos escolares e universitários marca o fim desse terceiro setênio. O homem é agora maduro para poder tomar o seu destino em suas próprias mãos. Mas, até o dia da sua morte, deveria conservar este apanágio de um verdadeiro jovem: saber aprender e corrigir suas próprias ideias.
Rudolf Lanz
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