A criança, meio inconsciente e sonhadora, está
entregue às influências do ambiente. Tudo a permeia. O ideal seria deixar a
criança pequena entregue à sua fantasia, num mundo harmonioso, sem distúrbios.
Durante os primeiros três anos a criança aprende mais do que em qualquer outra
época da vida: o andar ereto, o falar e o pensar são três vitórias básicas sobre
o animal. Com elas, a criança torna-se homem. Durante essas três conquistas, e
durante todo o resto da evolução, pais ou outros adultos devem sempre estar
presentes para dar uma mão, tão firme quanto carinhosa. De dentro para fora,
deverá desabrochar uma vida anímica baseada principalmente no corpo, na vida
orgânica e seus ritmos. A disciplina e a regularidade são base para toda a sua
vida futura e constituem uma poderosa ajuda para o fortalecimento de sua
confiança e o desenvolvimento de uma criança segura de si.
Em fins do século passado o grande biólogo Ernst
Haeckel formulou sua genial lei bio-genética fundamental: “Em sua evolução
embrionária, todo animal percorre, sucessivamente, estados correspondentes aos
graus de evolução que os animais inferiores percorreram, na história das
espécies, até chegarem a ele”. Essa lei pode ser aplicada, de certa maneira, à
evolução da criança: ela também repete, de maneira concentrada, as várias fases
da evolução anímico-espiritual do gênero humano.
Antes de examinar as etapas da evolução da
criança, lembremo-nos de alguns fatos importantes:
A personalidade não nasce com o nascimento! O eu
de um recém-nascido é tão velho como o de qualquer outra pessoa. Na presente
encarnação, porém, ele ainda não permeou os diversos envoltórios
terrenos.
No decorrer da vida, o eu procura realizar-se, a
si e ao seu carma. Pais e educadores devem ajudá-lo nessa
tarefa.
Daí a grande responsabilidade de quem lida com
crianças. Não se pode criar uma personalidade, um eu! Mas pode-se favorecer ou
dificultar o seu desabrochar correto.
Muito do que é aprendido na vida infantil, e
esquecido depois, reaparece mais tarde, sob forma de faculdades adquiridas. A
lei da metamorfose domina a evolução da criança.
Rudolf Steiner ensina que a vida humana é
caracterizada por ciclos de 7 anos, marcados pela predominância de determinada
configuração anímico espiritual.
Sem investigar o porquê desses ciclos, estudaremos
rapidamente os três primeiros.
Ao nascer, o corpo físico está “acabado”. Existem
e funcionam todos os órgãos (menos os da reprodução). Mas o corpo etérico ainda
está, durante os primeiros sete anos, intimamente ligado ao corpo físico, ao
qual consolida, estrutura e dota de funcionamento certo: a criança se fixa pouco
a pouco na alimentação dos adultos, ergue-se, aprende a mover-se no espaço,
aprende a falar; finalmente, o aparecimento da segunda dentição marca a época em
que essa tarefa plasmadora do corpo etérico chega a um certo fim, libertando-o
em parte para outras funções. Poderíamos, pois, dizer que o nascimento de um
corpo etérico autônomo apenas ocorre aproximadamente aos 7 anos, na idade em que
a criança está pronta para entrar na escola.
Quem conhece a existência de um corpo etérico, e
mais ainda, quem admite o seu intenso desenvolvimento durante os primeiros 7
anos de vida, (o corpo físico foi construído durante os 9 meses de gravidez) não
estranha que esse corpo precise de “alimentação” adequada. Em outras palavras:
para se desenvolver harmoniosamente, o corpo etérico deve receber certos
impulsos; em caso de falta destes, ou quando são prejudiciais, o corpo etérico
não desenvolve harmoniosamente suas forças e funções.
Quais são esses alimentos
úteis?
Em primeiro lugar, tudo o que constitui um ritmo.
A regularidade da vida cotidiana (horas certas para se levantar, comer,
deitar-se) e a repetição de certos atos (passeios, oração para agradecer o
alimento que recebe, ouvir sempre uma história antes de dormir) constituem uma
poderosa ajuda para o fortalecimento do corpo etérico, dando à criança uma
confiante segurança.
Depois, a criança deve ter a possibilidade de dar
vazão à sua fantasia criadora. De dentro para fora, deverá desabrochar uma vida
anímica baseada principalmente no corpo, na vida orgânica e seus ritmos. Contos
de fadas devem animar a imaginação; brinquedos simples devem deixar lugar à
fantasia. Nada de trens elétricos, de brinquedos mecânicos, de bonecas de
matéria plástica, caricaturas horríveis de seres humanos. Todos esses brinquedos
matam a imaginação da criança e desfiguram seus instintos plasmadores e sadios.
Nada também de formas geométricas, de jogos de matéria plástica que deturpam o
sentido táctil da criança. Materiais naturais, pedaços de madeira, trapos,
pedras, conchas, plantas, areia, lápis de cera, eis os companheiros ideais, com
os quais a criança pequena, cheia de imaginação, constrói o “seu”
mundo.
Nessa idade, mais do que em qualquer outra, a
criança, meio inconsciente e sonhadora, está entregue às influências do
ambiente. Tudo a permeia. Como o seu organismo tão delicado sofre com discussões
em voz alta entre seus pais, com o ruído do rádio, com as irradiações da TV, com
o barulho e o nervosismo da nossa vida citadina, e com as mudanças bruscas de
ambiente!
O ideal seria deixar a criança pequena entregue à
sua fantasia, num mundo harmonioso, sem distúrbios. Nessa idade a criança não é
acessível a conceitos de moral e a regras abstratas de comportamento. Ela vive
imitando o seu ambiente, em geral de maneira inconsciente. Muitas vezes, a
semelhança de uma criança com seus pais ou avós não é congênita, mas adquirida
pela imitarão de gestos e expressões. O exemplo dos pais e irmãos educa, e não
os gritos e preceitos lógicos.
Durante os primeiros três anos a criança aprende
mais do que em qualquer outra época da vida: o andar ereto, o falar e o pensar
são três vitórias básicas sobre o animal. Com elas, a criança torna-se homem.
Durante essas três conquistas, e durante todo o resto da evolução, pais ou
outros adultos devem sempre estar presentes para dar uma mão, tão firme quanto
carinhosa. A pequena criança deve ser guiada! Nada mais errado do que deixá-la
sempre “livre”. A disciplina e a regularidade são alimentos da sua organização
etérica, base de toda a sua vida futura.
Se as crianças já aparentam, muitas vezes, um
caráter bem pronunciado, elas não possuem ainda, salvo erros da educação,
manifestações tipicamente intelectuais e conscientes. A criança pequena
naturalmente possui um eu, mas ainda sem autoconsciência. Ela vive entregue ao
mundo exterior que a permeia. Até a idade de três anos, ela nem emprega as
palavras “eu” ou “você”: chama a si própria pelo seu nome (“Maria quer comer”),
e somente a partir dessa idade nascem os primeiros vestígios da memória
permanente: o adulto, em geral, não tem reminiscências de fatos anteriores à
idade de três anos.
Qualquer despertar artificial e prematuro das
faculdades sentimentais e mentais prejudica a evolução harmoniosa da criança.
Ela chegará sozinha ao grau de desenvolvimento que constitui o fim desse
primeiro período de 7 anos e que se manifesta por vários sinais: ela se alonga,
seus dentes definitivos aparecem, ela muda de aspecto e tudo indica que está,
com o segundo período de 7 anos, ingressando na maturidade
escolar.
O segundo período, que se estende dos sete aos
catorze anos, é caracterizado pelo desenvolvimento intensivo do corpo astral,
que passa a ser o elemento predominante, até o seu turbulento “nascimento”
definitivo, no momento do reboliço da puberdade. A astralidade toma, então,
posse do corpo físico.
Durante essa fase – que corresponde à idade
escolar – é principalmente o corpo astral que deve ser “alimentado” de maneira
sadia, como o corpo etérico o foi durante a época anterior. Os sentimentos se
formam e precisam de impulsos apropriados. Os sentidos, de simples órgãos
sensitivos, passam a ser “antenas” de uma alma: a criança começa a adorar
música, pintura; ela compartilha dos sofrimentos e das virtudes dos heróis das
suas leituras; em uma palavra, a alma e a vida anímica passam ao primeiro
plano.
Nessa idade a criança desenvolve seus dons
artísticos. Ao mesmo tempo, o corpo etérico, liberto das suas tarefas do
primeiro setênio, torna-se instrumento poderoso do pensar e da memória. Ainda
seria prematuro qualquer intelectualismo (que pressupõe o poder de abstração do
eu), mas acoplado à vida sentimental, o pensamento se torna capaz de grandes
esforços deverá ser desenvolvido na escola de maneira
adequada.
Entre os “alimentos” do corpo astral figuram
ideais, exemplos de figuras com sentimentos nobres e empolgantes. Os grandes
heróis dos mitos e da história fecundam a imaginação e o idealismo, as vivências
artísticas elevam a alma e o corpo inteiro, com a sua intensa reserva de forças,
quer ser o instrumento de impulsos volitivos (esporte), estéticos (dança,
mímica), etc. A imaginação e a fantasia sentimental se projetam para fora, e
nunca, mais tarde de, as crianças saberão interpretar com tanto fervor, em peças
teatrais ou pequenas encenações de vivências próprias.
Os perigos, nessa idade, são múltiplos, mas o
maior é a fixação do idealismo e da fantasia em figuras de valor duvidoso. Daí o
efeito nefasto das estórias em quadrinhos, da idolatria de bandidos. Horrível
também é a influência dos meios modernos de divulgação, com seu baixíssimo nível
moral, intelectual e artístico: TV, rádio, revistas, etc. Os crimes que se
cometem contra a criança nessa idade têm efeitos incalculáveis e
definitivos.
Nessa idade, dos 7 aos 14 anos, a personalidade já
se afirma mais. Não se limitando a imitar, a deixar-se permear, a criança quer
agora idealizar, respeitar, venerar. A autoridade baseada no afeto, no amor, é a
melhor relação pedagógica nessa idade, e o professor deve respeitar o eu dos
seus alunos, que se vai afirmando cada vez mais, e ao mesmo tempo procurar
corresponder ao seu idealismo ainda meio inconsciente.
No terceiro período, dos 14 aos 21 anos, a parte
que se desenvolve é o eu. Tendo alcançado sua plena maturidade, o indivíduo é
considerado civil e penalmente responsável; passa a ser um membro aprovado da
coletividade.
Com a evolução do eu, nasce a consciência da
própria personalidade e, com ela, um sentimento de alienação e de separação dos
outros. O indivíduo começa a ter uma vida íntima própria. O adolescente faz
poesias, a mocinha escreve um diário íntimo. Depois da crise da puberdade, a
vida sentimental, salvo influências negativas de fora, se sublima. O jovem
começa a “amar”. Ao mesmo tempo, seu idealismo se dirige para objetos mais
elevados, mais abstratos: discussões filosóficas e metafísicas, ideais políticos
e sociais, enchem-Ihe o espírito.
Nessa altura suas faculdades mentais estão
plenamente desenvolvidas.
Sem perigo de prejuízos, o pedagogo pode e até
deve recorrer ao poder de abstração do seu aluno. Do mundo da alma, o jovem
passa ao mundo do espírito. Dúvidas e problemas religiosos o atormentam; ele
começa a criticar tudo. Uma educação bem dirigida não impedirá esse desejo de
criticar, mas procurará evitar o cinismo e a negatividade, dando ênfase à
necessidade de sempre respeitar o outro, de nunca esquecer a própria
responsabilidade moral e social.
O término dos estudos escolares e universitários
marca o fim desse terceiro setênio. O homem é agora maduro para poder tomar o
seu destino em suas próprias mãos. Mas, até o dia da sua morte, deveria
conservar este apanágio de um verdadeiro jovem: saber aprender e corrigir suas
próprias ideias.
Rudolf Lanz
www.antroposofy.com.br/forum/a-evolucao-da-crianca-segundo-a-antroposofia/
Nenhum comentário:
Postar um comentário